Como é a Páscoa na República Tcheca – tradições e gastronomia

A Páscoa na República Tcheca tem tradições bem diferentes da cultura brasileira. Para começar, a segunda-feira após o domingo de Páscoa também é feriado (neste ano será dia 21 de abril), não tem ovos de chocolate e sim ovos de galinha de verdade, pintados à mão, e a celebração em si está mais ligada a rituais pagãos, que comemoram o início da primavera.

Mescla de tradições

As comemorações da Páscoa (Velikonoce, em tcheco) estão mais ligadas a tradições pagãs, relacionadas à natureza, fim do inverno e comemoração da chegada da primavera. Mais tarde, as tradições cristãs chegaram ao país e por isso aconteceu uma mistura. Isso se manifesta diretamente na culinária. Por isso, é muito comum aqui na República Tcheca o cordeiro de Páscoa, que é uma espécie de “colomba pascoal” ou um bolo doce em forma de cordeiro. O bolo é feito em um molde de cerâmica.

Então, comer o cordeiro doce na Páscoa tem a ver com o simbolismo que este animal traz, remetendo ao sacrifício da morte de Jesus. E no paganismo, o animal simboliza a primavera. A carne do cordeiro foi substituída pelo bolo em forma do animal, simplesmente por falta da carne mesmo, por causa de guerras e crises econômicas ao longo do tempo.

Ovos de galinha decorados

Antigamente, as pessoas tinham que esperar pela primavera para comer ovos de galinha. Isso porque as galinhas domésticas eram abatidas durante o inverno. E, juntamente com a morte e renascimento de Jesus acontecendo na primavera, tudo isso simboliza um recomeço. Por essa razão, a Páscoa por aqui é cheia de ovos pintados à mão com motivos barrocos e fitas coloridas penduradas em árvores e ramos.

A técnica de pintura dos ovos chama-se “kraslice” e é feita de forma artesanal, fazendo pequenos orifícios nos ovos para esvaziá-los e depois começa-se a pintá-los. A kraslice é considerada uma das peculiaridades mais interessantes da Páscoa tcheca.

Quitutes de Páscoa

Durante este período na República Tcheca, você poderá provar doces especiais. O mais tradicional é uma espécie de colomba pascal – por aqui você encontra com o nome de “mazanec” – que é um pão doce com recheio de frutas cristalizadas, amêndoas ou nozes.

Além disso, as padarias preparam pães pequenininhos trançados que se chamam “jidáš” ou “jidášci”, o termo vem justamente do nome Jidáš, que significa Judas. Segundo informações do Museu de Gastronomia de Praga, eles começaram a ser preparados na República Tcheca no final do século 18 e representam a traição de Judas e a crucificação de Cristo, por isso esse pãozinho é geralmente decorado com uma coroa de espinhos ou tem a forma de uma corda enrolada forte, fazendo referência à corda que Judas Iscariotes se enforcou.

Outra curiosidade é que a massa do ‘jidášek’ é uma das mais simples, não tem recheio e nem uva passa ou nozes como o “mazanec”. Segundo a tradição, estes doces devem ser untados com mel e ser consumidos especialmente na quinta-feira santa – chamada pelos tchecos de “quinta-feira verde” – de preferência antes do sol nascer. Este ritual trará boa saúde e proteção contra picadas de cobra.

A pučálka, que são ervilhas tostadas, são típicas da época de Páscoa também e costumava-se fazer esse prato no primeiro domingo da Quaresma, justamente porque era um prato vegetariano com muitas vitaminas, ideal para suprir algumas deficiências nutricionais pelo fato das pessoas não comerem carne durante esse período.

A sexta-feira santa, como acontece no Brasil na maioria das famílias cristãs, é um dia em que se faz necessário se privar de comer carne. Sendo assim, é um dia favorável para comer peixe. Este hábito remete a séculos longínquos, nos quais as pessoas com pouco dinheiro comiam purê de batata assado em forma de peixe.

No entanto, o prato típico da sexta-feira santa por aqui é a zelňačka, uma tradicional sopa espessa de repolho com batata. Também é comum comer espinafre, diferentes tipos de leguminosas ou knedlíky doces – típicos bolinhos de farinha com recheio doce. 

Depois do almoço, as famílias costumavam sair em busca de tesouros nas florestas e matas. Acredita-se que neste dia, a terra se abre e mostra objetos de valor oculto.

No sábado santo, não pode faltar à mesa o prato chamado “recheio de Páscoa” – em tcheco Velikonoční nádivka – que nada mais é do que nossa típica torta salgada recheada. O prato é preparado com carne defumada, ovos e ervas frescas, incluindo a urtiga, que simboliza a primavera. A massa é feita com um tradicional pão tcheco (rohlík) envelhecido, que deve ser picado, pode ser substituído pelo pão francês ou pão de trigo/de sal, como é chamado no Brasil, mais uma xícara de leite, ovos e as ervas. A carne defumada é usada para o recheio.

Este “recheio de Páscoa” também é conhecido como “hlavička“, que em português pode ser traduzido como cabecinha.  Costumava-se preparar a hlavička, porque era prático, geralmente as famílias já deixavam a torta pronta um ou dois dias antes do domingo da ressurreição e comiam quando voltavam da igreja. Até hoje, muitas famílias costumam fazer a torta nesta data.

Veja no final do post um vídeo de como se prepara a Velikonoční nádivka.

O domingo de Páscoa reúne as famílias em torno das mesas com refeições mais fartas à base de carne. E a estrela do dia por aqui é o tradicional doce de cordeiro pascal, feito de massa simples de bolo com suco, raspas de limão e uma colher de rum. Porém, a fôrma do bolo é que muda neste caso: é usado um molde com a forma de cordeiro, simbolizando o sacrifício de Jesus Cristo.

Confira também no final deste post um vídeo de como se prepara o cordeiro da Páscoa.

Na República Tcheca e em outros países da Europa central, a segunda-feira após o domingo de Páscoa é feriado nacional, dedicado à celebração das manifestações pagãs conectadas com a chegada da primavera. Neste dia, especialmente nas pequenas vilas tchecas, costuma-se seguir enraizadas tradições de séculos atrás. O ambiente é muito alegre e descontraído. No cardápio, temos a presença marcante da “šmigrust”, que significa o mesmo que pomlázka (leia o subtítulo abaixo para entender melhor). 🙂

Trata-se de um galho de salgueiro entrelaçado, com o qual os tchecos costumam chicotear as mulheres na segunda-feira de Páscoa para garantir a elas boa saúde, beleza, fertilidade e vitalidade.

Apesar do nome ser excêntrico, o “šmigrust” é simplemente uma sopa preparada com linguiça picante refogada e ovos cozidos. Fala-se que a sopa, servida de recompensa aos homens, que vão de casa em casa distribuindo palmadas, supostamente consegue curar a dor de estômago ou mal estar provocado pela quantidade de álcool ingerido por comemorar tanto a chegada da primavera com os shots da típica slivovice, uma espécie de cachaça tcheca. 

Tradição do pomlázka

Pomlázka são umas varas trançadas e decoradas com fitas coloridas, que os meninos e homens usam para “chicotear” o bumbum das meninas e mulheres. O ritual, que acontece na segunda-feira após o domingo de Páscoa, começa com uma reunião de rapazes que se juntam para ir de porta em porta nas vilas tchecas à procura de mulheres de todas as idades para serem chicoteadas, em troca elas presenteiam os rapazes com os ovos coloridos e decorados previamente e também oferecem algo para comer e beber, como pãezinhos recheados, doces e doses de bebidas alcoólicas.

No momento de chicotear as mulheres, os homens cantam uma canção folclórica. É bom que fique claro que esse “chicotear” é algo suave e simbólico. E que as meninas e mulheres querem ser chicoteadas, pois segunda a tradição aquela que não receber as chicoteadas não terá fertilidade.  Assim, a simbologia da fecundação fica evidente, quando o homem com um vara dá chicotadas na mulher e em troca ela lhe oferece um ovo. Em Praga, a prática dessa tradição já não é tão comum, mas nos vilarejos da Boêmia do Sul e na região da Morávia é mais forte, significando um momento de celebração, principalmente, entre os jovens.

Fonte: https://english.radio.cz/